A hora mágica

Lembro de um dia, quando eu era muito pequena em que minha mãe me levou a uma feira e eu me perdi. Até hoje mamãe conta essa história.
Depois de procurá-la sem encontrar rumei para casa sozinha. Subi uma rua, desci outra na esperança de encontrar alguma coisa conhecida, porém, as casas desconhecidas me pareciam antipáticas e frias. Com medo de bater a qualquer porta aproximei-me de uma arvore e exausta, adormeci. Acordei ao anoitecer. Despertei assustada e sem hesitar corri para a porta da primeira casa e bati. Dentro de meia hora estava sã e salva dentro de casa.

Minha mãe perguntou por que eu havia demorado tanto a procurar socorro, não soube explicar nem o sei hoje a não ser dizendo que o encanto do anoitecer ainda me domina, ainda acalma meus temores e me anima o espírito.
Sinto-me mais confiante ao anoitecer, é a hora da volta ao lar, uma hora em que nos sentimos deliciosamente famintos e ansiosos pelo jantar e por um belo banho. De repente meu mundo entrou nos eixos. 

Essa era a hora encantada quando pedíamos o que queríamos, um jantar quentinho na mesa depois de um dia inteiro de brincadeiras, um doce qualquer – uma hora de ternura.
Quase tão bom quanto voltar para casa ao fim do dia é a alegria de iniciar uma viagem há essa hora. Você já experimentou?

É um precioso intervalo entre o dia e a noite quando o ar azul parece cheio de excitação e sentimento de aventura...Ou caminhar numa rua tranquila e arborizada quando os pássaros pipilam com sonolência e os insetos acordam para dar inicio a um belo clamor musical.
Das horas mágicas infantis permanece a lembrança e a sensação de felicidade de poder sair correndo de casa para brincar de esconder ao anoitecer.
À medida que escurecia as brincadeiras ficavam encantadoramente mais difíceis. 'Estou vendo Maria!' Mas será Maria? Ou imaginação apenas uma sombra ilusória? Brilha uma luz...depois outra. Vaga-lumes!
E começa a caçada correndo e gritando faces quentes acariciadas pelo ar frio, meninos e meninas perguntam para cima e para baixo; 'Apanhei mais do que você!'. Ah! Que doces lembranças!
Jamais esquecerei das amoras que marcavam as estações do ano ao cair da noite era uma arvore perdida numa rua ainda de terra no caminho da escola. Do frescor de terra molhada, da fumaça das fogueiras que em julho animava as festas juninas, do cortante ar do anoitecer no inverno quando o céu fica salpicado de roxo brilha como um espelho
.
Estou agora no mato: 
- Paro nos degraus e avisto o grande curral defronte a vassoura em punho, depois de varrer as folhas secas que caem nesta época do ano...minha mente vagueia de novo. Anoitecer no inverno! Parece ser este o melhor de todos.
Uma luminosidade sinuosa verde-prata que palpita e treme suavemente, uma hora em que o dia morre de repente, a noite nasce de repente, mas com grande paz...
Neste instante não posso duvidar da união do homem com o Universo.
Fico com a convicção de que deve haver um propósito no todo, e de que nós somos partes desse propósito.
No azul incomensurável do crepúsculo há um mistério que transcende a rotação desta pedra rodopiante e banal em que vivemos.
Yvone Pereira
Desejo um lindo final de semana a todos.

22 comentários:

  1. Yvone
    Quanta sensibilidade neste texto. Me fez lembrar tb de quando me perdi quando era criança, senti um aperto no peito horrível. E tb o alívio que tive quando reencontrei minha irmã mais velha. Lendo seu texto voltei a sentir tais sensações.
    Muito bom reelembrar.

    Ah, como de costume hoje lá no Mundinho tem entrevista especial. Passa lá.

    Um ótimo final de semana.

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  2. Que lindo este texto !
    Fiquei com vontade de usar trechos dele no meu futuro Fotolivro...
    Sabe o que eu lembrei ?
    Do cheiro do bolo de banana quando chego em casa....é altamente acolhedor pra mim depois de um dia perturbado e cansativo ....

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  3. Olá, Yvone!
    Lindo seu texto! Mas sabe que nesta hora sinto uma imensa solidão? Acho que por que fui criada na cidade grande e, nesta hora tem aquele agito, ouço os carros lá fora, panela de pressão no fogo.... e me sinto só no meio de um formigueiro de gente indo pra lá e pra cá..... engraçado, né?
    beijos

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  4. Este comentário foi removido pelo autor.

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  5. O crepúsculo tb exerce um certo fascínio sobre mim. Gostei muito de seu texto leve, poético, sinestésico.
    Enquanto eu cá me descabelo com o dito programa, que já foi desinstalado e reinstalado umas 30 vezes em menos de 24h (ao menos recuperei meu arquivo!!!!), alivio o espírito com textos como o seu. Obrigada e ótimo final de semana.

    BJks

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  6. Olá Yvone
    Tenho muita dificuldade em ler textos extensos, não vou mentir, acabo lendo por etapas e na maioria das vezes não leio por completo, mas esse post foi muito interessante, a forma como você o construiu, me deixou nostálgica, os olhos marejaram, moro numa capital, que quando a noite cai , os primeiros sentimento que brotam é de insegurança e medo, isso me entristeceu, mas isso não superou a saudade de minha infância.
    Obrigada!
    Bell
    bellevaldesign.blogspot.com

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  7. oi Santinha

    Parbéns pelo lindo texto!!!
    umlindo fim de semana pra vc também!!!

    bjus ana maria

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  8. olá, Santinha!
    como escreves bonito - transmite sensibilidade e nostalgia sem tristeza. seu texto ficou lindo!
    bom fidi semana!
    bjkinhas com carinhos....

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  9. Ivone
    Eu também sou apaixonada com o entardecer.
    O mais maravilhoso que já vi foi uma tarde em Varginha. Posso fechar o olho e tornar a ve-lo.
    Sabe estamos pretendendo ir em Nova York em outubro e um dos motivos é só para ver o outono. Disseram que é maravilhoso. Mas temos primeiro que passar no visto.
    Com carinho Monica

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  10. oi Yvone! quanta poesia! que belo texto, me deletei com a tua história!
    eu tb adoro o anoitecer, adoro ver o por do sol, os passarinhos procurando abrigo, a calmaria, as cores do céu, mas tb adoro o amanhecer - quando todos estão dormindo e eu estou lá só - olhando as cores do céu, adoro viajar nesta hora, o ar , o cheiro do amanhecer - acho que é pq quando criança acordavamos de madrugada para viajar aos parentes ou á praia, isto me traz uma certa nostalgia gostosa!
    bomfds
    bjs

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  11. Ah amiga...viajei. Voltei para Jaguarão, onde aquele céu é o céu mais bonito do mundo. Lembrei dessa hora, quando eu era pequena e ficava sentada no muro olhando a chegada das estrelas. E num tempo bem recente, eu sentada na frente do sítio, tomando chimarrão e olhando o sol se pôr bem na minha frente, num espetáculo que parecia que era só para mim: eu, o sol e nada mais. Dava até para aplaudir.
    E ainda em Jaguarão, quando a gente vai para a beira do rio e o sol se põe à nossa direita e seus raios cruzam por debaixo da ponte, por entre seus inúmeros arcos e o céu fica azul, lilás, alaranjado e cor-de-rosa, tudo ao mesmo tempo. É de perder o fôlego.
    Lindo post.
    Xêro!!

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  12. Oi Ivone, Santinha do Céu! Imaginei cada cor e sensação expressas aqui neste "memorial" e confesso que suspirei a cada frase. Sua infância se mistura com a sua visão madura e isso me faz acreditar que a sensibilidade é algo nato no ser humano, não tem jeito mesmo... Você acertou em cheio hoje para mim com esta reflexão, ameeeeeeeei!!!

    Obs: Conheci pessoalmente a querida e sensível Paty do Ecos do Japi! Obrigada por ter me indicado a leitura e conhecimento desta pessoa mais do que especial que agora também é uma nova amiga! Depois te conto o que a Luiza falou pra ela, foi paixão a primeira vista!Mil beijocas!

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  13. Nossa que "aventura" em, sua mae deve ter ficado furiosa, mas que otimo que tudo se ajeitou, é mesmo o anoitecer é magico, toda vez que parao para olhar o por do sol, me da uma sensaçao que nao sei explicar, abraços!

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  14. Voltei pra prosear, agora que acabei o bendito fotolivro!!!! E já o enviei para publicação!!! Via!!!!

    Yvone, que delícia! Eu tb me identifico muito com a letra do samba do avião, principalmente quando se volta de uma viagem internacional com escala no Rio. Também tive essa sensação de que Deus existe, ao ver paisagens tão diferentes do que estamos habituados. Uma coisa fantástica, mesmo! E também por ver a inteligência do homem em reagir às adversidades da natureza, como em alguns países. Aqui temos tudo tão fácil e em abundância que nem pensamos que não é assim no mundo todo.

    BJs e ótimo fds.

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  15. Yvone que texto lindo, até me arrepiei...
    Menina, engraçado que tantas coisas boas estavam lá na nossa infância e penso se os meus filhos terão um dia...
    Existe rua de barro hj em dia?!
    Nãoooo
    Menina, quando pequena eu morava em uma casa e era de barro... era engraçado que mamãe ficava louca quando não chovia e quando chovia rs
    Por causa da sujeira que causava.
    Ahhh saudades.
    Bjss

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  16. Eta mulher que escreve bem viu...
    E essa reforma? te deixando de cabelos brancos? rs....
    beijo grande pra vc e vai tirando foto pra me mostrar...rs

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  17. Ninha, que saudades de abraça-la, viu!!! Esta descrição, mix de lembranças da infância com o despertar para os acontecimentos glamurosos da vida, é o vagalume das idéias que nos inspiram.

    Saudades daqui, daí, de vc!

    Beijos em seu coração e paz.

    Paty

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  18. Lindo Yvone, essa hora é mesmo magica e especial,o bacana é que lendo seu texto , me fez refletir e vem a tona muitos bons momentos.
    bjs querida e boa semana

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  19. Olá Santíssima!
    escrevi sobre você lá no meu blog e espero que o "milagre" esteja à altura da Santa! Rsrsrs...
    Aquele abraço!!!

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  20. Que relato maravilhoso, Yvone!
    É de uma beleza e de uma sensibilidade poética fascinantes!
    Essa hora realmente é mágica.
    Beijos e parabéns.

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  21. Yvone,

    To devorando teu blog !

    Muito bom mesmo !

    Eu moro meio no mato, sabe, saí da metrópole pra uma cidade menor, onde ganhei um camarote de observação do crepúsculo, que também é minha hora preferida do dia.

    Sempre que estou em casa nessa hora mágica me sento no degrau da porta da cozinha e fico ali, observando as mudanças no céu, na temperatura, nos ruídos, e inevitavelmente acabo percebendo também as mudanças em mim.

    Paz e bem!

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  22. Este comentário foi removido pelo autor.

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